terça-feira, 30 de setembro de 2014

Brasil tem terceiro maior déficit externo do mundo, diz FMI. E pode piorar, se Dilma ´trambique` continuar

Flávia Barbosa - O Globo

Segundo relatório do organismo, país registra rombo de US$ 81 bi, equivalente a 3,6% do PIB


WASHINGTON - O Brasil tornou-se, em 2013, a nação emergente com o maior déficit externo do mundo, mostra o Fundo Monetário Internacional (FMI) em capítulo do relatório trimestral “Panorama da Economia Mundial” divulgado nesta terça-feira na capital americana. Em oito anos, o país deixou de apresentar saldo positivo nas suas transações com o resto do mundo (que envolvem comércio exterior, fluxo de investimentos, gastos de turistas, empréstimos etc) para apresentar rombo de US$ 81 bilhões, o equivalente a 3,6% de seu Produto Interno Bruto (PIB) e 0,11% do PIB global. Para o FMI, é hora de o governo agir para reduzir o rombo, antes que consequências negativas se materializem.

Em 2006, base de comparação escolhida pelo Fundo por ser o último período integralmente livre de abalos que culminariam na grande crise de 2008, o Brasil não integrava as listas de maiores superávits externos nem de maiores déficits. Ou seja, apresentava contas mais equilibradas. EUA e Reino Unido, nesta ordem, ocupam os primeiros lugares no ranking de maiores saldos vermelhos.

— O caso do Brasil é importante. O Brasil tinha superávit em 2006 e passou para um déficit em 2013. Os níveis de déficit estão próximos ao que encontramos como limite para economias emergentes. Neste sentido, pode ser talvez preocupante. Por esta razão, o Brasil precisará a começar a trabalhar para reduzir esses desequilíbrios — afirmou o economista Marco Torrones, do Departamento de Pesquisa do FMI, que coordenou a avaliação.

Vice-diretor do Departamento de Pesquisas do Fundo, Gian Maria Milesi Ferreti complementou que, mesmo com o avanço do rombo externo em países como Brasil, Índia, Indonésia, México, Turquia, Canadá e Austrália, o quadro global é positivo. Ele admitiu, porém, que o resultado dessas nações não está em linha com os fundamentos das economias, como seria desejável:

— Comparado com os desequilíbrios antes da crise, o que vemos é que, embora tenhamos déficits relativamente grandes em algumas economias avançadas e mercados emergentes, comparados com o que achamos que é apropriado com base nos fundamentos econômicos, esses déficits mantêm-se, em termos absolutos, muito menores do que aqueles que víamos antes da crise. E esta é a base da nossa avaliação geral, de que o o risco global de uma reversão nas contas correntes diminui.

PAÍS É O TERCEIRO MAIS ENDIVIDADO

O Brasil também subiu, em 2013, na lista de países com o maior nível de endividamento no exterior, pulando da sexta para a terceira posição, atrás apenas dos EUA e da Espanha, respectivamente. A dívida externa total atingiu US$ 750 bilhões, ou 33,4% do PIB (1,01% do PIB global).

“Na maioria dos casos (emergentes), as posições de maior endividamento não foram acompanhadas de ampliação dos investimentos fixos (como infraestrutura) e crescimento maior”, observa o FMI. A observação é genérica. O relatório do FMI não faz análise detalhada da situação brasileira.

Rombos externos não são necessariamente sintomas de crise e desequilíbrios graves. Mas, nota o FMI, “déficits grandes, e os compromissos externos (endividamento) líquidos associados a eles, no entanto, expõem o país a riscos de interrupção abrupta de financiamento ou da rolagem desses compromissos”. Especialmente quando há mudança de humor no mercado, seja por desconfiança com as condições domésticas, seja por mudanças em políticas que afetam o mundo, caso do fim do ciclo de estímulos monetários à economia dos EUA .

O FMI nota que o Brasil faz parte de um grupo de países na contramão do quadro geral internacional. De forma geral, no período entre 2006 e 2013, os principais desequilíbrios externos no mundo foram reduzidos. Os dez maiores déficits, que somavam 2,3% do PIB global, passaram a representar 1,2%.

Também houve desconcentração. Se os cinco maiores rombos somavam 80% do rombo em 2006, em 2013 eram menos de 65%. No resultado mais importante do levantamento, os Estados Unidos reduziram à metade seu déficit externo, de carona na desaceleração provocada pela Grande Recessão.

CHINA REDUZ SUPERÁVIT

Já a China, que preocupava analistas pelo efeito distorcivo do superávit que acumulava para a economia mundial, reduziu seu saldo positivo e cedeu o topo do ranking superavitário à Alemanha. A economia chinesa ampliou no período investimentos domésticos, utilizou política fiscal expansionista e enfrentou desaceleração da demanda externa. No lado do superávit, o grupo dos 10 maiores, que acumulava 2,1% do PIB global, hoje amealha 1,5%.

Apesar dos movimentos, o FMI diz que é cedo para saber se a redução do desequilíbrio externo global é permanente, embora a principal hipótese com a qual trabalha é que a recuperação do ritmo de crescimento não promoverá uma reversão radical do quadro atual.

Em outro capítulo do Panorama, o Fundo advoga que chegou a hora de o setor público dos países, independentemente do porte e do grau de desenvolvimento de suas economias, investirem pesadamente em infraestrutura. Segundo o organismo multilateral, o estoque de capital fixo público como proporção do PIB, uma medida de infraestrutura, caiu de forma significante em 30 anos.

Países emergentes, segundo o FMI, estão ficando para trás. O organismo tem recomendado ao Brasil sistematicamente que retome este tipo de investimento para melhorar a capacidade de oferta e religar os motores da economia brasileira. No relatório, aponta novamente para esta fragilidade, alertando que os efeitos deste tipo de entrave já estão sendo sentidos.

“Embora muitos fatores possivelmente estejam contribuindo, uma preocupação frequentemente expressa (sobre os emergentes) é infraestrutura inadequada. Em muitos mercados emergentes, incluindo Brasil, Índia, Rússia e África do Sul, gargalos de infraestrutura não são apenas preocupações de médio prazo, mas têm sido impedimentos ao crescimento mesmo no curto prazo”.