segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

"Alta tensão", editorial da Folha de São Paulo

Agrava-se sobremaneira a preocupação com a robustez do sistema elétrico. Pela última análise do risco de faltar energia no país, ultrapassamos –e muito– a fronteira do que é aceitável, e com o governo federal do PT a dar mostras de que vai reeditar a inação da administração do PSDB na crise da água.

No caso da eletricidade, o limite de tolerância foi fixado pelo Conselho Nacional de Política Energética (CNPE): 5% de risco de desabastecimento, acima do qual se torna imperativo cogitar medidas como corte de carga e até racionamento. Para estabelecer o número atual, computam-se dados como nível dos reservatórios e expectativa de chuvas nos meses seguintes.

Na época do apagão mais ou menos controlado de 19 de janeiro, que afetou áreas em 11 Estados, esse risco era de 4,9% para os subsistemas Sudeste/Centro-Oeste e Nordeste. Divulga-se agora que, no momento presente, o primeiro deles –responsável por 2/3 da capacidade nacional de geração– alcançou o patamar de 7,3%.

Essa situação alarmante decorre da falta de chuvas recorde em janeiro. Nos reservatórios de hidrelétricas do Sudeste/Centro-Oeste, a precipitação ficou 62% abaixo da média histórica para o mês.

Os modelos utilizados para calcular o grau de risco não produzem números tranquilizadores nem nos cenários mais favoráveis. Mesmo quando se simula o despacho de todas as usinas termelétricas disponíveis, e não só aquelas que produzem energia com mais baixo custo, a ameaça de deficit cai para 6,1%, ainda acima do tolerável.

As péssimas novas não poderiam chegar em hora pior. Os consumidores já se acham na perspectiva de um aumento na conta de luz, podendo representar verdadeiro tarifaço nas estimativas mais pessimistas.

Tudo isso compõe o efeito retardado e daninho da tentativa da presidente Dilma Rousseff (PT), a partir de 2012, de baixar as tarifas de energia por decreto. A presente estação de chuvas parcas só veio agravar a situação de um sistema aleijado pela incompetência.

O Tribunal de Contas da União exige agora do Ministério de Minas e Energia uma diagnóstico mais realista sobre a capacidade do sistema gerador de atender à demanda por eletricidade em 2015. Mais que isso, o MME precisa vir a público para explicar de maneira coerente e detalhada, e não com declarações esparsas, o que fez e o que planeja para evitar novos apagões.

Não basta o ministro Eduardo Braga (PMDB-AM) dizer e repetir que sobra energia no país. Ele tem de demonstrar isso além de toda dúvida e convencer especialistas e leigos de que dispõe dos meios para reverter a situação de risco.