sábado, 7 de fevereiro de 2015

"Caindo de Maduro", editorial da Folha de São Paulo

Se a Venezuela encontra-se hoje à beira do abismo, a culpa recai sobre seus dirigentes, que não souberam conduzi-la a outro lugar.

Ao assumir a Presidência, em 1999, Hugo Chávez herdou um país onde metade da população vivia na pobreza. O preço do barril de petróleo, matriz econômica nacional, ficava em torno de US$ 10.

Pode-se calcular o tamanho da mudança em termos de disponibilidade de recursos quando o barril disparou nos anos 2000, chegando a valer US$ 145 em 2008.

Possuindo a maior reserva de óleo bruto do mundo, Chávez bancou gastos faraônicos, em especial na área social: saúde, moradia e educação gratuitas, por exemplo. Mercados subsidiados brotaram pelo país. O consumo explodiu.

Os resultados nesse campo apareceram. A pobreza caiu para 26% em 2012; o PIB per capita saltou de US$ 4.105 em 1999 para US$ 11 mil em 2011; o índice Gini, que mede a desigualdade, é o mais baixo da região. O chavismo, porém, devastou o setor privado com expropriações e controles de preços e câmbio.

Gastando mais do que podia, Chávez morreu em 2013, deixando um país minado por dívidas, ineficiência e corrupção, sem que tivesse feito reformas capazes de livrar a Venezuela da petrodependência.

Com o desgaste, seu herdeiro político, Nicolás Maduro, quase perdeu uma eleição organizada às pressas para que o chavista se beneficiasse da comoção nacional.

Maduro, porém, jamais deu conta da urgência de cortar gastos e ressuscitar o setor produtivo. Sua situação, que já era ruim, piorou sobremaneira após o barril de petróleo despencar de US$ 99 em junho para cerca de US$ 50 atualmente.

A queda na arrecadação pressiona reservas minguantes e aumenta o risco de calote da dívida venezuelana. Num país que compra fora quase tudo que consome, a carência de divisas para importação gera escassez e filas que infernizam o dia a dia. Após arrecadar US$ 1 trilhão em 16 anos, o governo é incapaz de garantir leite e papel higiênico no comércio.

A crise gera agitação social. Milícias governistas ameaçam se rebelar. Estudantes ensaiam retomar protestos que, há um ano, deixaram 43 mortos. Numa demonstração de virulência e autoritarismo, Maduro permitiu o uso de armas letais contra manifestantes violentos. A medida piora ainda mais a imagem de um presidente com apenas 22% de apoio.

O governo enfrentará um páreo duro no pleito parlamentar do segundo semestre, mas a maior dúvida é se Maduro conseguirá chegar ao fim de seu mandato, em 2019.