sábado, 28 de fevereiro de 2015

Clint Eastwood, 84 anos e um dos gigantes de Hollywood, tem o maior sucesso comercial de sua carreira e nem pensa em se aposentar


Com Blog Ricardo Setti - Veja

Clint Eastwood: "A aposentadoria não é uma ideia convidativa. Adoro golfe, mas não quero ser obrigado a jogar golfe por falta do que fazer" (Foto: Neil Wilder/Corbis Outline/Latinstock)
Clint Eastwood: “A aposentadoria não é uma ideia convidativa. Adoro golfe, mas não quero ser obrigado a jogar golfe por falta do que fazer” (Foto: Neil Wilder/Corbis Outline/Latinstock)

IMPÁVIDO COLOSSO

Reportagem publicada em edição impressa de VEJA

Sniper Americano é contra a guerra ou a favor dela? É um filme de ação ou um estudo moral? Seu protagonista, o atirador de elite Chris Kyle, é um herói ou um homem indigno?
No centro da divergência – que diminui mas não anula as chances de o filme sair do Oscar deste domingo com um ou vários prêmios [esta reportagem foi escrita antes da premiação, e Sniper só recebeu um prêmio, o de edição de som] -, Clint Eastwood permanece sereno: em uma fase da vida na qual não é incomum que se acredite ter certezas a oferecer, o diretor de 84 anos continua buscando perguntas a fazer, sem se incomodar se é possível ou não encontrar as respostas certas para elas.
Feliz com a bilheteria estrondosa (quase 400 milhões de dólares, e contando) e em grande medida inesperada do filme, a maior de toda a sua longa carreira, Eastwood conversou com a editora executivaIsabela Boscov sobre a controvérsia em torno de Sniper Americano, os eventuais fracassos, a importância de não planejar demais e o único conselho que ele acredita ter a dar aos sete filhos, de diferentes casamentos e relacionamentos.
A seu ver, surgiu da controvérsia em torno de Sniper Americanoalgo de iluminador ou instigante, ou ela seria mera polarização de opiniões?
Minha impressão é que algumas das pessoas que têm alimentado essa controvérsia estão mais interessadas em obter reconhecimento e manter seu nome em evidência do que em debater.
O filme tem, é claro, uma mensagem sobre as urgências do combate, mas eu diria que sua mensagem contra a guerra tem peso idêntico; não são poucos os soldados que sentem estar no lugar errado, e mesmo Kyle tem de se esforçar mais e mais para se convencer de que o que está fazendo é o certo.
Eu não fui a favor dessa guerra [do Iraque]. Mas, a partir do momento em que os soldados são enviados à batalha, meu desejo é que possam cumprir sua missão e voltar vivos para casa.
Essa questão, a dos efeitos da violência cometida com a convicção do justo e certo, é constante em seu trabalho.
É difícil discutir intenções: enquanto você está rodando um filme, uma multiplicidade de opiniões a respeito dele cruza a sua cabeça, toma forma e então muda – de tal modo que, no fim, se alguém vier lhe perguntar quem são as pessoas que vão querer vê-lo, a única resposta possível é “não tenho a menor ideia”. Um filme só existe de fato nos olhos de quem o vê.
Bradley Cooper e Chris Kyle em "Sniper Americano", o filme de maior bilheteria da longa carreira de Eastwood (Foto: Wagner Brothers)
Bradley Cooper e Chris Kyle em “Sniper Americano”, o filme de maior bilheteria da longa carreira de Eastwood (Foto: Warner Brothers)
A lição que aprendi a aceitar é que tenho de dar o meu melhor; mas, quando o resultado do meu trabalho chega aos cinemas, só o público decide se quer vê-lo ou prefere escolher outra coisa.
Dói quando o público decide que não é o seu filme que ele quer ver? J. Edgar, por exemplo, foi praticamente ignorado.
Talvez o público mais jovem não conheça J. Edgar Hoover, e talvez o público que tem idade para se lembrar dele não frequente mais o cinema. O mesmo talvez possa ser dito de Invictus, sobre Nelson Mandela.
É sempre uma pequena decepção, mas remoer desapontamentos não leva a nada. É partir para outra. Inversamente, se cinco meses atrás me tivessem dito que Sniper Americano seria o maior sucesso comercial da minha carreira, eu teria ficado surpreso.
Vai ver é o pessoal que não foi ver J. Edgar que está comprando os ingressos.
Oitenta e quatro anos é uma idade respeitável, mas ela não parece ter diminuído sua disposição: faz apenas meio ano que o senhor lançou Jersey Boys.
Sinto-me ótimo e estou com boa saúde.