segunda-feira, 29 de junho de 2015

"Delação no Brasil foi sentida como golpe nos termos originais da visita aos Estados Unidos", por Matias Spektor

Folha de São Paulo


Dilma demorou a aceitar o convite de Obama. Quando o fez, optou por uma visita a jato, sem dar tempo para grandes preparativos.

A presidente concebeu sua viagem como um "choque de credibilidade" 
internacional. A ideia era visitar os Estados Unidos para divulgar uma mensagem capaz de restaurar a reputação perdida durante o primeiro mandato.

O Planalto sabia que a operação seria uma batalha ladeira acima. Afinal, a presidente fora reeleita com a menor margem da série histórica. Ela chegaria aos EUA com baixa popularidade, recessão, inflação, uma base parlamentar rachada e acusações de irresponsabilidade fiscal.

A presidente não temeu o improviso, porém, e mobilizou sua tropa a toque de caixa. Joaquim Levy montou uma agenda pesada no mundo dos negócios; Jaques Wagner talhou expectativas de contratos futuros na área militar. Kátia Abreu e Armando Monteiro prometeram "recalibragem comercial", abrindo um pouco a mais fechada das economias do Brics.

O plano teve incentivo da Casa Branca desde o início. Para os EUA, o Brasil é grande demais para afundar, e o custo de um gesto de apoio é minúsculo. Assim como Clinton apostou em FHC quando o tucano estava em seu pior momento e Bush estendeu a mão a um Lula recém-eleito, Obama decidiu dar a Dilma o benefício da dúvida neste início de segundo mandato.

No entanto, nesse fim de semana que passou, os termos originais da visita sofreram um golpe frontal. Não bastasse o escândalo da Petrobras macular a imagem pessoal da presidente que durante anos esteve no comando da empresa, a delação de Ricardo Pessoa escancarou as portas do Planalto, empurrando dois ministros palacianos em direção ao precipício.

Apesar de o governo Obama esbanjar otimismo sobre o futuro do Brasil, dificilmente Dilma voltará para casa com uma vitória definitiva.

Como diplomacia a jato não existe, a restauração da imagem do Brasil no mundo demandará tempo e investimento. Nesse processo, Dilma terá de aplicar doses grandes de engajamento pessoal em política externa.

Ela já sabe como isso é difícil quando se trata dos EUA. "Quero uma relação excelente com o governo americano", disse a seu chanceler após sua primeira eleição, em 2010.

Nas reuniões com Obama, porém, houve pouco progresso real. Em seguida, ele apoiou a demanda indiana ""mas não a do Brasil– por assento permanente no Conselho de Segurança da ONU. E tudo piorou quando o governo americano virou a principal fonte de crítica internacional à "nova matriz econômica".

O Planalto entende que o objetivo central da política externa neste momento é reverter o descrédito internacional do país. A visita desta semana não fará mágica. Com alguma sorte, será o início de uma longa caminhada.

MATIAS SPEKTOR, doutor em relações internacionais pela Universidade de Oxford, é professor da FGV. Siga no Twitter