quinta-feira, 31 de março de 2016

Repasses da Odebrecht no exterior irrigaram propina ao PP, diz Janot

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Folha de São Paulo


Transferências internacionais de contas ligadas à Odebrecht no exterior para o doleiro Alberto Youssef foram usadas para o pagamento de propina ao PP, principalmente ao ex-deputado João Pizzolatti (SC), segundo a Procuradoria-Geral da República.

A informação consta da denúncia protocolada na quarta-feira (30) no Supremo Tribunal Federal contra Pizzolatti, o ex-ministro Mário Negromonte (ex-PP-BA) e outros cinco políticos do PP sob acusação de recebimento de dinheiro desviado da Petrobras, por meio da diretoria de Abastecimento.

Segundo o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, um dos delatores, Rafael Ângulo, transportador de valores de Youssef, apresentou quatro comprovantes de transferências bancárias no exterior que tinham relação com esses pagamentos de propina.

Os repasses foram entre 2009 e 2010 em contas na Alemanha que, segundo o Ministério Público, seriam ligadas à Odebrecht, para contas na China e em Singapura, totalizando US$ 1,5 milhão. "Todos esses documentos contêm vinculação à empresa Braskem [ligada à Odebrecht]", escreveu Janot.

Segundo o procurador-geral da República, a propina era referente a um negócio da Braskem com a Petrobras.

"Realizadas as transferências bancárias internacionais, Alberto Youssef disponibilizava as correspondentes quantias em reais, no Brasil, ao PP e particularmente a João Alberto Pizzolati Junior. Dessa forma, entre 2009 e 2010, pelo menos US$ 1.530.000 foram repassados a título de propina", afirmou o procurador-geral.

Pedro Ladeira/Folhapress
O procurador geral da República, Rodrigo Janot, durante reunião do Conselho Nacional do Ministério Público
O procurador-geral da República, Rodrigo Janot

Além disso, Janot apresenta uma série de elementos encontrados contra Pizzolatti.

A operação de busca e apreensão em seus endereços encontrou patrimônio que estava mantido em nome de terceiros, segundo a denúncia. Por exemplo, um automóvel registrado em nome de uma loja de veículos, e um apartamento que tinha em Blumenau também sem estar em seu nome.

Foram encontrados ainda depósitos em dinheiro, fracionados, na conta pessoal dele, no total de R$ 330 mil.

NEGROMONTE

A denúncia também aponta depósitos fracionados, sem identificação do depositante, feitos nas contas de dois ex-assessores do ex-ministro Negromonte, como pagamentos de propina.

Foram R$ 336 mil depositados por meio de 169 operações para um assessor e R$ 534 mil em 116 operações para o outro.

Para Janot, ambos só recebiam salários da Câmara ou de outros órgãos públicos e "não tinham motivos nem recursos para movimentar tanto dinheiro, sem identificação de origem".

De acordo com a denúncia, um dos assessores repassou R$ 60 mil em 37 operações para a conta pessoal mantida por Negromonte e seu filho, o atual deputado Mário Negromonte Júnior (PP-BA).

Ainda contra o ex-ministro, Janot aponta entregas em dinheiro feitas por emissários do doleiro Alberto Youssef e transferências da empresa Unipar Carbocloro a um empresário da Bahia como forma de pagar Negromonte.

Embora focada nos dois ex-deputados e no filho de Negromonte, a denúncia também aponta corrupção dos deputados Arthur Lira (PP-AL), Luiz Fernando Faria (PP-MG), José Otávio Germano (PP-RS) e Roberto Britto (PP-BA). No caso deles, o principal elemento foram doações feitas por empresas acusadas de envolvimento com a corrupção na Petrobras.

Os delatores Alberto Youssef e o ex-diretor de Abastecimento Paulo Roberto Costa já sustentaram em seus depoimentos que as doações eram uma das formas de pagamento da propina.

Segundo dados da PGR ao STF, o PP e Paulo Roberto receberam R$ 357,9 milhões em propina de contratos da estatal, entre 2006 e 2014.

OUTRO LADO

Procurada na noite desta quinta (31), a Odebrecht informou que não se manifestará sobre o assunto.

A defesa de Pizzolatti informou que ainda não teve acesso à denúncia e vai se manifestar, no momento oportuno, nos autos do processo.

O advogado de Negromonte e Negromonte Júnior, Carlos Humberto Fauaze, afirmou que não é possível dizer que depósitos bancários sem identificação da origem eram propina. "A presunção de inocência milita a favor do cidadão. Caberia ao Ministério Público indicar por quais motivos entende que este ou aquele depósito é proveito de crime", disse.

Sobre as entregas em espécie e os repasses ao empresário baiano, Fauaze afirmou que se sustentam apenas na palavra de delatores e, para ele, essa prova não é suficiente para denunciar seus clientes.

Os demais parlamentares já negaram o recebimento de propina e o envolvimento com irregularidades na Petrobras.