quinta-feira, 27 de outubro de 2016

Susan Jacobs, diplomata: ‘No Brasil, as decisões demoram uma eternidade’

Fábio Teixeira - O Globo

Após passar pela Argentina, americana veio ao Rio para discutir práticas relacionadas à Convenção de Adoção e Abdução de Haia


"Estamos tentando fazer com que os países ajudem crianças a encontrar lares permanentes em qualquer lugar do mundo", explica a diplomata Susan Jacobs - Ana Branco / Agência O Globo


“Nasci em Michigan, na cidade de Detroit. Tenho 71 anos. Sou a assessora Especial para Assuntos da Criança do Departamento do Estado Americano. Sou formada em Direito pela Georgetown University. Comecei a carreira diplomática em 1974. Já servi na Nova Guiné, na Índia, em Israel e na Romênia, entre outros lugares.”

Conte algo que não sei.
Os Estados Unidos já adotaram mais de 250 mil crianças, de mais de cem países, nos últimos 15 anos. Uma das coisas que fazemos é facilitar adoções internacionais. Outra é ajudar países a estarem de acordo com a Convenção de Haia, da qual Estados Unidos, Brasil e outros países são signatários. Em Brasília, falamos com juízes e ONGs a respeito da Convenção de Haia e a abdução internacional de crianças. Conversamos muito com autoridades daqui sobre o sistema judiciário brasileiro, para vermos como ajudar. No Rio, falamos de adoções, porque tratamos muito de vistos para imigrantes.

Porque esta atenção ao Rio em relação à adoção?
Por muito tempo, tivemos poucas adoções de crianças brasileiras por famílias americanas. Estamos tentando fazer com que os países ajudem crianças a encontrar lares permanentes em qualquer lugar do mundo. Não tenho os números do Brasil, mas crianças sem família, em geral, ficam em orfanatos ou institutos similares. Não é uma forma boa de serem criadas. Elas devem ser cuidadas por famílias. Trabalhamos com os países para que, quando tentarem conseguir lares para estas crianças, pensem na possibilidade de adoção internacional. Isso vale para o Brasil, ou qualquer outro: nem todas as crianças vão ter um lar em seu próprio país. É neste sentido que outras nações podem ajudar. Há mecanismos que permitem estas adoções.

O sistema brasileiro é bom?
De acordo com as pessoas com quem temos conversado, o sistema é bastante bom. Só não está acomodando todas as crianças. Uma das coisas que discuti é que precisamos espalhar que existe esta possibilidade. Falamos também do fato de que o Brasil hoje permite a adoção por pessoas de todo tipo. Foi bem produtivo.

Tivemos o caso Sean Goldman. Quais foram os efeitos dele nos Estados Unidos?
Foi o caso mais famoso de abdução do planeta. Virou uma lei nos Estados Unidos. Nosso Congresso e o Executivo estavam preocupados com a questão das abduções. Então, fizeram esta lei, de abril de 2014, que obriga o Departamento de Estado americano a avaliar a performance de todos os países nesta área, independentemente de eles serem signatários ou não da Convenção de Haia. Nos últimos anos, o Brasil não está respeitando, no que se refere a decisões judiciais.

Quais são os problemas?
A legislação internacional determina que a criança abduzida deve esperar o julgamento de ações em sua residência habitual, ou seja, no país em que vivia antes de ser abduzida. O problema, no Brasil, é que as decisões demoram demais. Há infinitas apelações. Queremos fortalecer nossa parceria para que os juízes brasileiros entendam que se deve diminuir o número de apelações e para que deem prioridade a estes casos. Hoje, demoram uma eternidade para tomar decisões.

O que a senhora classifica como eternidade?
No Brasil, há mais de cem milhões de processos. É um para cada duas pessoas. Para mim, uma eternidade é mais de um ano. Temos um caso para ser julgado há mais de sete anos. A menina foi abduzida em 2009, e não tenho certeza se o pai a viu, desde então. Nos Estados Unidos, tivemos um caso similar, e a criança foi devolvida ao Brasil em quatro semanas. É assim que tem que ser.