terça-feira, 29 de novembro de 2016

Kim Kataguiri: "Fidel Castro morreu levando o jornalismo brasileiro junto"

Folha de São Paulo

"Líder destemido", "Herói da igualdade", o homem que transformou Cuba "em referência nas áreas de Saúde e Educação". Essas foram as expressões usadas por setores da grande imprensa para descrever Fidel Castro, um dos ditadores mais sanguinários que o mundo já viu.

Mais uma vez, a militância política tomou conta do jornalismo. Supostos avanços na Saúde e na Educação que se tornaram referência para o resto do mundo, luta por igualdade, busca de um sonho. Nem parecia que as notícias tratam da trajetória de um assassino em massa. No máximo, e fazendo cara feia, Fidel foi chamado de "figura controversa".

A cobertura mais evidentemente absurda foi a do canal "GloboNews", que convidou a historiadora Claudia Furiati, autora da única biografia autorizada de Castro, para falar sobre a vida do ditador socialista.

Quando confrontada com o fato de que, apesar do discurso a favor da igualdade, Fidel era um governante autoritário e que até perseguia homossexuais, Furiati afirmou que, em seu livro, explorou essa "questão humana" do ditador com "muito respeito e admiração", afinal, "nós, humanos, temos grandes contradições". A historiadora ainda explica que temos de entender que Fidel conduziu uma revolução, "e numa revolução não há lugar para concessões".

Pois é. Não podemos fazer concessões numa revolução. Nem que seja para a democracia ou para os direitos humanos. Fidel torturou e fuzilou opositores políticos, viveu uma vida de luxo às custas de uma população miserável, mas fez tudo isso em nome da revolução, de um mundo melhor. Façamos, então, uma concessão a ele.

Imaginem se tivéssemos uma biógrafa tão compreensiva e tolerante para explorar a "questão humana" de Hitler, Stalin e Mussolini. Apesar das atrocidades que cometeram, eram apenas seres humanos com suas grandes contradições.

Por fim, ainda sobre a repressão do governo de Fidel, Furiati analisa que "as pessoas reproduzem informações que são veiculadas pela contrapropaganda (...) sem uma verdadeira apuração."

Ou seja, se você sai falando por aí que Cuba não é livre, igualitária e democrática, está simplesmente reproduzindo o que é propagandeado por aí e não conhece a verdade underground que só é divulgada por um dos maiores canais de notícia da TV brasileira e pelos principais setores da imprensa.

De qualquer maneira, fico feliz que a imprensa brasileira possa dizer esse monte de baboseira. Significa que vivemos numa democracia. Significa que há liberdade de expressão. Significa que não vivemos em Cuba.