quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

"Como fazer inimigos", por Ruy Castro

Folha de São Paulo


Alex Brandon - 28.jan.2016/Associated Press
FILE - In this Jan. 28, 2017, file photo, U.S. President Donald Trump speaks on the phone with Prime Minister of Australia Malcolm Turnbull in the Oval Office of the White House in Washington. For decades, Australia and the U.S. have enjoyed the coziest of relationships, collaborating on everything from military and intelligence to diplomacy and trade. Yet an irritable tweet President Donald Trump fired off about Australia and a dramatic report of an angry phone call between the nations' leaders proves that the new commander in chief has changed the playing field for even America's staunchest allies. (AP Photo/Alex Brandon, File) ORG XMIT: BKCD401
Donald Trump em telefonema com o primeiro-ministro da Austrália sobre abrigo a refugiados


Em 1936, o americano Dale Carnegie (1888-1955), professor de locução e oratória, publicou "Como Fazer Amigos e Influenciar Pessoas". Foi um dos primeiros livros de autoajuda explícita e já saiu vendendo que nem banana na feira. Oitenta anos depois, está na casa dos 50 milhões de exemplares, parte deles no Brasil, onde nunca saiu de catálogo. Uma pesquisa classificou-o em sétimo lugar entre os livros "mais influentes" produzidos nos EUA, ou seja, que mais fizeram a cabeça dos americanos — imagine os outros.

O que Carnegie aconselha? Que, ao tratar com alguém sobre qualquer assunto, você enxergue esse alguém como um futuro aliado, não um adversário. Ouça o que ele tem a dizer. Estimule-o a falar de si mesmo. 

Chame-o pelo nome. Faça-o sentir-se importante. Cite os seus próprios defeitos antes de se referir aos dele. Em hipótese alguma desqualifique-o ou discuta com ele — não há vencedores numa discussão. Faça com que os problemas pareçam fáceis de resolver — e você verá como eles se resolverão.

E, ah, sim, sorria sempre ao falar.

Parece idiota e talvez seja. Mas Carnegie ficou rico, fez "amigos" e influenciou milhões. Bem, há um que ele não influenciou: Donald Trump.

Em 20 dias falando grosso na Presidência, Trump brigou com Canadá, México, China, Coreia do Norte, Austrália, Irã, Iraque, Líbia, Sudão, Somália, Síria, a União Europeia, a ONU e a Otan. Rebaixou os latinos em geral, declarou guerra à imprensa e, até a última contagem, já tem fortes inimigos em empresas como Netflix, Apple, Amazon, Microsoft, Google, Facebook, LinkedIn e Twitter, além de fábricas de automóveis, companhias aéreas e bancos.

Trump pode ter lido o livro de Carnegie e resolvido fazer tudo ao contrário. Exceto num item: comete suas barbaridades sorrindo — mesmo que apenas para si próprio.