domingo, 19 de fevereiro de 2017

Delação de Eike pode esclarecer elos com Cabral, Cunha e PT

Renata Agostini - Folha de São Paulo


Preso na penitenciária carioca de Bangu, Eike Batista terá uma longa lista de explicações a dar aos investigadores caso queira pleitear um acordo de delação premiada.

Com o avanço da Lava Jato, uma miríade de depoimentos situaram as empresas do "grupo X" e o próprio empresário na engrenagem de esquemas de corrupção.

Delatores e candidatos à colaboração já apontaram o ex-bilionário como partícipe de negociatas envolvendo contratos da Petrobras, financiamentos analisados pela Caixa Econômica Federal e dívidas de campanha do PT.


Roberto Castro - 15.dez.2010/Agência IstoÉ
O empresário Eike Batista cumprimenta a presidente eleita Dilma Rousseff ao lado do presidente Luiz Inácio Lula da Silva durante festa de premiação "Os Brasileiros do Ano", da Editora Três, no clube Monte Líbano, em São Paulo (SP). (Foto: Roberto Castro/Ag. Isto É) ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Eike Batista cumprimenta Dilma Rousseff, presidente eleita, e Lula em evento de 2010


A defesa de Eike diz que é "prematuro" falar em colaboração, mas interlocutores do empresário dizem que se trata de um caminho analisado.

Caso decida segui-lo, há detalhes a serem esclarecidos sobre Sérgio Cabral, cuja relação o levou à prisão.

Eike tornou-se réu na Justiça do Rio por ter pago US$ 16,5 milhões a Cabral, que foi governador do Rio de Janeiro pelo PMDB. A denúncia aceita pelo juiz Marcelo Bretas fala em pagamento de propina, mas os procuradores ainda não sabem explicar o que Eike recebeu em troca.

Até o momento, há suspeitas: licenças, desapropriações e outros atos do governo do Rio para viabilizar a construção dos portos do Açu e de Itaguaí e a concessão do Maracanã, que Eike levou em parceria com a Odebrecht.


GOVERNO DO PT

Há dúvidas ainda sobre o que Eike lucrava ao prestar favores a figuras importantes dos governos do PT, como o ex-ministro da Fazenda Guido Mantega, que serviu às gestões Lula e Dilma Rousseff.

O próprio Eike procurou a Lava Jato para confirmar a informação de que, respondendo a um pedido de Mantega feito em 2012, pagara US$ 2,35 milhões a João Santana, o marqueteiro que elegera Dilma dois anos antes.

A mulher de Santana, Mônica Moura, havia narrado o episódio aos investigadores em sua proposta de delação.

Eike, contudo, não disse o que lucrou com o gesto.

O ex-bilionário perseguiu o selo de "empresário do PT" e tornou-se próximo a diversos políticos do partido, como o ex-ministro José Dirceu, até chegar ao próprio Lula.

O empenho do ex-presidente em ajudar Eike a tentar sair da crise que terminou sepultando seu conglomerado é narrado no livro "Tudo ou Nada" (Record, 2014).

Nele, a jornalista Malu Gaspar conta como o petista fez lobby para empresas de Eike, como quando se encontrou em 2013 com o então primeiro-ministro russo para dizer do interesse numa parceria entre a OGX e uma estatal de petróleo daquele país.

Alguns frutos dessa relação com emissários petistas emergiram mais recentemente como no depoimento de Ivo Dworschak Filho, ex-diretor do estaleiro OSX, à Lava Jato em maio de 2016. O executivo contou que pagamentos foram feitos a Dirceu por meio de contratos de fachada com o consórcio OSX e Mendes Júnior, que detinha contratos com a Petrobras.

Segundo Ivo, Eike não só sabia da propina como o orientou pessoalmente a não interferir no acerto.

A empresa de logística LLX também foi beneficiada por um acerto entre Eike e Eduardo Cunha de acordo com o relato de Fábio Cleto, ex-vice da Caixa, cujo acordo de delação já foi homologado.

Segundo ele, o empresário pagou propina a ele e ao ex-deputado do PMDB, hoje preso em Curitiba, para atuar na liberação de um empréstimo de um fundo do FGTS.

Se estiver disposto a falar às autoridades, não faltará a Eike por onde começar.


OUTRO LADO

O advogado Fernando Martins, que faz a defesa do empresário Eike Batista, afirma que falar de delação premiada é prematuro.

Ele nega que Eike Batista, que se tornou réu na Justiça Federal do Rio após ser denunciado sob acusação de corrupção e lavagem de dinheiro, tenha participado de negociações para obter qualquer vantagem. Martins afirma ainda que isso ficará comprovado perante a Justiça.

Segundo o defensor, o grupo EBX era um conglomerado de mais de sete empresas, todas com gestão própria e autonomia na tomada de decisões.

Sendo assim, não seria de conhecimento de Eike Batista, que ocupava a posição de presidente do conselho de administração das companhias, se alguma irregularidade foi cometida.


PISTAS DE UMA DELAÇÃO

1. Propina a Cabral
Eike transferiu ao ex-governador do Rio, Sérgio Cabral, US$ 16,5 milhões por meio de uma conta no Panamá, segundo denúncia aceita pela Justiça. Eike pode esclarecer a troco de quê fez o pagamento

2. Dívida de campanha
Eike admitiu ter transferido, a pedido de Guido Mantega, US$ 2,35 milhões a João Santana, que fizera a campanha de Dilma Rousseff à presidência. Eike pode dizer se recebeu algo em troca do governo petista

3. Ajuda na Sete Brasil
O operador Fernando Soares, o Baiano, disse em delação premiada que Eike pagou R$ 2 milhões a José Carlos Bumlai para que ele defendesse interesses do grupo junto à Sete Brasil. Eike pode dizer se o pagamento ocorreu e quem Bumlai acionou para ajudá-lo

4. Contrato para OSX
Um ex-executivo do estaleiro OSX, Ivo Dworschak Filho, afirmou ao MPF que houve pagamento ao ex-ministro José Dirceu para a obtenção de contratos com a Petrobras. Eike pode explicar se houve de fato propina

5. Crédito do FI-FGTS
Ex-vice-presidente da Caixa, Fábio Cleto afirmou em delação que houve pagamento de propina para ele e para o ex-deputado Eduardo Cunha para que a empresa de logística LLX recebesse um empréstimo do FI-FGTS. Eike pode contar se fez os pagamentos e como foi abordado,