domingo, 19 de fevereiro de 2017

Jornal premia reportagem sobre sítio de Lula, o maior corrupto do Brasil

Carlos Nardi/WPP/Folhapress
Vista aérea do sítio frequentado pelo ex-presidente Lula em Atibaia, no interior de São Paulo, nesta segunda-feira
Vista aérea do sítio frequentado pelo ex-presidente Lula em Atibaia, no interior de São Paulo, nesta segunda-feira


Com Folha de São Paulo


A reportagem "Odebrecht fez obra em sítio ligado a Lula, diz fornecedora", publicada em janeiro do ano passado, venceu a edição 2016 do Prêmio Folha de Jornalismo, concedido desde 1993 aos melhores trabalhos produzidos pelos profissionais do jornal.

O texto do repórter Flávio Ferreira mostrou como a maior empreiteira do país reformou —gastando cerca de R$ 500 mil apenas em materiais— o sítio Santa Bárbara, em Atibaia, usado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e por seus familiares.

Operação Lava Jato acusou a Odebrecht de se envolver em desvios na Petrobras, estimados em R$ 6 bilhões. Condenado a mais de 19 anos, o herdeiro do grupo, Marcelo Odebrecht, está preso em Curitiba, onde assinou acordo de delação premiada com os procuradores da operação.

A reportagem lançou luz sobre as relações de Lula (que, oficialmente, não é o dono do sítio) com a empreiteira; a reforma começou em outubro de 2010, quando o líder petista ainda estava no Planalto.

Pouco mais de um mês após a publicação do texto, o ex-presidente, alvo da 24ª fase da Lava Jato, foi levado à Polícia Federal no aeroporto de Congonhas, em São Paulo, para depor sobre o caso.

Fizeram parte do júri que escolheu os vencedores da edição 2016 do prêmio: Roberto Dias, secretário de Redação da Folha, Paula Cesarino Costa, ombudsman do jornal, Marcelo Benez, diretor-executivo comercial da empresa, e os colunistas Tati Bernardi e Samuel Pessôa.



QUEDA DE GEDDEL

Na categoria Reportagem, o prêmio foi dado à série de textos que precipitaram a queda do ministro Geddel Vieira Lima (Governo), em uma das maiores crises políticas da gestão de Michel Temer.

No primeiro, de autoria de Natuza Nery e Paulo Gama, o ex-ministro da Cultura Marcelo Calero disse ter sido pressionado por Geddel a liberar a obra de um prédio em Salvador, vetada pelo Iphan (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional), subordinado à pasta de Calero.

As reportagens de Sylvia Colombo sobre o processo de paz na Colômbia foram premiadas na categoria Especial. De Bogotá, entre setembro e outubro, a repórter narrou a assinatura do histórico acordo entre o governo e as guerrilhas da Farc —depois de cinco décadas de guerra— e a sua rejeição pelos eleitores.

repórter fotográfico Rivaldo Gomes, do jornal "Agora", venceu na categoria Foto com a imagem do grupo que o agrediu enquanto ele registrava a movimentação em uma praia de Santos (SP).

Gomes foi atacado a socos e chutes por banhistas –um deles o acusou de "tirar foto da mulher dos outros". Teve os dentes quebrados, e sua câmera foi destruída.


Rivaldo Gomes/Folhapress
Grupo de agressores que espancaram o repórter fotográfico do jornal 'Agora', Rivaldo Gomes
Grupo de agressores que espancaram o repórter fotográfico do jornal 'Agora', Rivaldo Gomes


Mesmo assim, fez com um celular a imagem do grupo que o havia espancado, o que acabou lhe rendendo o prêmio. A foto foi usada como prova no inquérito policial.

Na categoria Arte, o trabalho vencedor foi a série de cinco cadernos especiais sobre os 95 anos da Folha, completados em fevereiro de 2016.

Entre os temas dos cadernos estavam a cobertura dos debates do Encontro Folha de Jornalismo, realizado em 18 e 19 de fevereiro do ano passado, 95 das principais reportagens da história do jornal e as histórias por trás de fotos e filmes que marcaram época.


28.fev.2016/Folhapress
Prêmio Folha - História desdobrada
Reprodução de um dos cadernos comemorativos dos 95 anos da Folha


Na categoria Edição, o trabalho premiado foi "House of Lula" —três vídeos de título alusivo à série norte-americana "House of Cards" que buscaram resumir os turbulentos acontecimentos da política brasileira em março de 2016. 

Naquele mês, Lula foi alvo de uma operação da Polícia Federal e levado para prestar depoimento na Lava Jato.

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A edição do "Guia Folha" com dicas sobre a rua Augusta, "a mais badalada e democrática da cidade", foi a vencedora na categoria Serviço.



INVESTIGAÇÃO

Autor do texto vencedor do Prêmio Folha de 2016, Flávio Ferreira, 44, diz que seu objetivo era fazer uma reportagem extensa sobre a Lava Jato que fosse autônoma –isto é, não dependesse de delações ou vazamentos da Polícia Federal, Ministério Público ou Judiciário.

Ferreira decidiu investigar informações que obteve de que empreiteiras envolvidas na Lava Jato haviam concedido vantagens indevidas a Lula e passou a fazer apurações de campo semanais em Atibaia, cidade a 60 km de SP onde fica o sítio utilizado pelo ex-presidente.

"O principal método foi falar com pessoas nas proximidades do sítio: comerciantes, moradores", diz o repórter. "Mas nenhuma testemunha aceitava falar em 'on' [ou seja, identificando-se] para a reportagem."
Só depois de cinco meses a dona de uma loja que forneceu materiais para a reforma no sítio decidiu dar um depoimento publicável, seguida por um marceneiro que trabalhou na obra.

Segundo Ferreira, seu foco está em fazer apurações aprofundadas e independentes. "Penso que é assim que o jornalismo pode dar contribuições às investigações e obter critérios para avaliar o trabalho das autoridades."

Formado em direito pela USP e jornalismo pela PUC-SP, o repórter está na Folha desde 2008. É criador e instrutor de cursos promovidos pela Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo.