segunda-feira, 24 de julho de 2017

"Detalhes do Contingenciamento Orçamentário do 3º Bimestre de 2017", por Felipe Ohana

Detalhes do Contingenciamento Orçamentário do 3º Bimestre de 2017: Contingenciamento de R$ 5,9 bilhões


1) Governo aumentou a estimativa de arrecadação por conta dos precatórios (Lei 13 463 de 6 de julho de 2017):  + R$ 10,2 bilhões

    Embora a lei autorize ao governo a cancelar e a se apropriar dos valores de precatórios pagos e não sacados por mais de dois anos, não há confisco. Se o credor demandar, o governo tem que devolver o que foi cancelado  (art. 3º).

    Conclusão: Apesar da autorização legal, este recurso tem a natureza de um empréstimo. Não é um recurso primário (a exemplo da arrecadação de um tributo) que possa ser classificado para cobrir déficit. Ele financia o déficit, como qualquer empréstimo o faria, mas sem abatê-lo. Há, portanto, erro conceitual. Este erro é  conveniente às contas do governo. É uma pedalada conceitual.

2) Governo transformou os empréstimos do FIES em despesas primárias: + R$ 6,3 bilhões

     O desembolso do FIES é empréstimo e por conseguinte não é despesa porque o valor emprestado volta para o governo, no prazo e com juros combinados.

   O Banco Central emprega a técnica de acompanhar o resultado fiscal observando as dívidas e os haveres do governo na rede bancária. Quando o FIES empresta, o aluno emite uma "promissória" em favor do governo. Esta promissória está fora da rede bancária. Assim, o BC não enxerga e por esta razão lança os empréstimos como se fossem despesas (porque não enxerga o crédito correspondente).

 O Tesouro calculava certo, tratava o FIES como empréstimo. Para corrigir esta discrepância, o BC convenceu ao Tesouro a errar junto. Agora, o Tesouro lança o FIES como despesa.

     Conclusão: Este erro, além de ampliar o déficit em 2017 no valor de R$ 6,3 bilhões, elevou as despesas de 2016 (em R$ 7 bilhões) e, logo, o teto de gastos para 2017 (EC 95) também cresceu no montante de R$ 7,5 bilhões (= R$ 7 x IPCA de 7,2%) . O erro conceitual gera um aumento indevido no teto de despesas para 2017.


3) O Gasto com pessoal vai aumentar (segundo as estimativas do governo) 6,47% acima da inflação.

     O Gasto com pessoal em 2016 foi R$ 257,9 bilhões. A projeção da inflação média para 2017 é 3,62%. Com isso, a conta de pessoal (de 2016) corrigida pela inflação chega a R$ 267,2 bilhões. A previsão de gasto com pessoal para 2017 é R$ 284,5 bilhões. Com isso o aumento real dos gasto com pessoal é de 6,47% (=284,5/267,2).

   Na hipótese de ser aceitável corrigir os salários pela inflação, a correção além desta marca resultará num acréscimo de R$ 17,3 bilhões.

   Conclusão: O aumento de gasto com pessoal  foi produzido pelas decisões do governo ao final de 2016 e meados de 2017.

4) As receitas não recorrentes foram ajustadas na 3ª reavaliação. Dentre as principais cabe citar:

     Programa de Regularização Tributária (MP 783/17): ampliada de R$ 8 bilhões para R$ 13,8 bilhões. Esta estimativa surpreende. A MP tende a fracassar.

      Repatriação II: reduzida de R$ 13,2 bilhões para R$ 3,4 bilhões. Faz sentido.
     
      Dividendos: reduzido de R$ 8,8 bilhões para R$ 5,9 bilhões.

Há confiança na arrecadação da MP 783 (+ R$ 5,8 bilhões). Pode haver frustração. Repatriação e Dividendos foram reduzidos em R$ 12,7 bilhões, ou seja, começam a desfazer o "otimismo" original sobre receitas não recorrentes.


Em suma:

Há movimentos variados nas estimativas. Acrescentam indevidamente os recursos da Lei 13 463 (+ R$ 10,2 bilhões) e os empréstimos do FIES (+ R$ 6,3 bilhões). O erro líquido é de R$ 3,9 bilhões a favor do governo (R$ 10,2 - R$ 6,3). Corrigem receitas não recorrentes (desfazendo parte do otimismo nesta frente), mas acrescentam R$ 5,9 bilhões a arrecadação com a MP 783 (otimismo).