sexta-feira, 11 de agosto de 2017

Hostilizado pela organização criminosa de Lula, crescem ainda mais as chances de Doria chegar ao Palácio do Planalto




João Doria Junior,prefeito de São Paulo (Foto:  Filipe Redondo/ÉPOCA)



Flávia Tavares e Débora Bergamasco - Epoca

Com o rebolado de um norte-coreano, João Doria Júnior dança. O prefeito de São Paulo se entregou ao axé na noite da segunda-feira,  dia 7, com o molejo de um paulistano na pipoca. Saltitando sem dobrar os joelhos, braços rígidos, Doria lembra um boneco de Olinda. Gilmelândia gasta seu vozeirão para exaltar a Bahia. Doria honra a dedicação da cantora com um sorriso esforçado de quem está sóbrio. De quem costumava requebrar uma vez por ano, nas micaretas empresariais que promovia em Comandatuba com sua empresa, o Lide. Doria dá uma leve rodopiada. Aponta para alguém de seu convescote, como quem diz “Olha eu aqui, que safadão”. Dá três pulinhos para trás. O vídeo entra em repeat eterno. João Doria tinha muito a comemorar. Aquela segunda-feira o revigorou. Ele estava com a energia ren-ovada (desculpe).
Mas não foi esse o vídeo que viralizou nas redes sociais. Foi outro, que mostra o que aconteceu horas antes, nas ruas de Salvador. João Doria, prefeito de uma cidade a 2.000 quilômetros dali, foi convidado pelo colega ACM Neto, do DEM, para receber o título de cidadão soteropolitano. O regimento da Câmara Municipal de Salvador, que concedeu a honraria a pedido do vereador Felipe Lucas, do PMDB, diz que para ser agraciadas com o título as personalidades têm de ser “comprovadamente merecedoras e com relevantes serviços prestados ao estado ou ao município”. Uma turma ligada a partidos de esquerda, como PT, PSOL e PCdoB, não conseguiu identificar na história de Doria um serviçozinho sequer à cidade – somente o fato de que seu pai, o deputado João Agripino Doria, era baiano. Os militantes reuniram-se na porta da Câmara quando ACM Neto  chegava com Doria. Reeleito em primeiro turno no ano passado, ACM Neto é um dos prefeitos mais bem avaliados do país e é muito popular. Está sempre nas ruas e não costuma ser hostilizado. Bastou uma caminhada com Doria para receber uma chuva de ovos. Um deles acertou em cheio o cocoruto de Doria. (Minutos depois, ele gravava para suas redes sociais condenando a agressão sem um fio de cabelo desalinhado.) Outros lambuzaram ACM Neto.
Pensa que o baiano se arrependeu do passeio com Doria? O palco que ACM Neto promoveu para o paulistano em terras nordestinas, férteis para o petista Luiz Inácio Lula da Silva, embora planejado, saiu imensamente melhor do que o encomendado. O tour de Doria em Salvador passaria despercebido não fossem as ovadas. O efeito foi o oposto. Queriam humilhar Doria; deram a ele a atenção que talvez ele não tivesse e um discurso de vítima da intolerância de seus adversários. Ah, os caprichos da política. A viagem acabou sendo como um presente de ACM Neto e do DEM. Quase um dote. Pode ter sido o primeiro passo numa parceria para 2018.
WILTON JUNIOR/ESTADÃO CONTEÚDO (Foto: Os senadores Tasso Jereissati e Aécio Neves,presidente interino e afastado do PSDB.Até a propaganda desune o partido)


A crise que dizima a classe política ressuscita algumas forças. O DEM, que quase morreu nos anos petistas, se viu com uma chance real de chegar à Presidência com Rodrigo Maia, que comanda a Câmara de Deputados e pode suceder a Michel Temer caso o peemedebista seja afastado por alguma das denúncias ainda por vir. Mas o DEM contempla vários caminhos. Busca engordar sua bancada com deputados do PSB. Em ascensão nas redes sociais, o tucano João Doria é uma força a ser cortejada. Naquela noite, já do lado de dentro da Câmara e bem longe de seus afazeres de prefeito da maior cidade do país, Doria, seguindo sua estratégia de sempre, fez um discurso inflamado contra “esquerdistas e o PT”. Berrou no microfone, punho ao alto. Discurso político a 2.000 quilômetros de casa não é coisa de prefeito; costuma ser coisa de quem quer ser candidato a presidente da República. A ovada incomoda mais o padrinho de Doria, o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, que se coloca na frente da fila como candidato tucano à Presidência. Novato na política, Doria já aprendeu que precisa cultivar opções e apoios, tanto para mostrar força em uma eventual disputa interna quanto para um cenário extremo, caso Alckmin lhe feche a porta. E o Democratas vem a calhar.
Não só ele, como também o PMDB. A segunda-feira já tinha rendido outro palanque a Doria. O presidente Michel Temer, tal qual um coadjuvante, viajou para São Paulo para assinar a transferência de uma área da União para a cidade para a construção de um parque. Temer, para usar um verbo d’antanho, chaleirou o tucano quanto pôde. Quis demonstrar que reconhecia a maneira como Doria se manteve fiel a ele durante o auge das acusações da JBS, numa indireta a Alckmin. O PSDB, ó surpresa, rachou na votação da denúncia contra Temer. O presidente ainda saiu vitorioso: 22 tucanos votaram com ele; 21, pela lógica. Mas Temer sabe que não pode contar com o ovo que ainda não foi posto (desculpe). Ao afagar Doria, o presidente finca uma cunha no racha tucano. Semeia a cizânia, essencial nas disputas. Prende a metade afim a si e libera a metade traidora. Sinaliza, ainda, que o PMDB, quando quer, sabe flertar. E está solteiríssimo em 2018, depois de anos de casamento com o PT. Lendo apropriadamente as tendências políticas do país, como de hábito, o PMDB vê em Doria, mais do que em um Bolsonaro, um nome conservador capaz de enfrentar uma eventual candidatura de Lula.
Enquanto DEM e PMDB ciscam em torno de Doria, as aves do PSDB quebram os ovos e não fazem omelete (desculpe). O presidente titular do partido, Aécio Neves, está afastado porque foi flagrado pedindo dinheiro ao empresário Joesley Batista por meio de um primo a quem ameaça de morte (e que recebeu tudo em uma mala lotada de notas de R$ 100). Aécio voltou a se mexer nos bastidores de Brasília, ainda que tímido, como se outro dia não estivesse proibido de entrar no Senado. Quem assumiu o comando do partido foi o senador Tasso Jereissati, do Ceará. Eles não se entendem. Na terça-feira, Doria colhia os louros da ovada nas redes sociais e o PSDB colocou no ar uma vinheta de 30 segundos, em cadeia nacional de rádio e televisão, chamando para o programa da legenda que será veiculado no dia 17. A frase “O PSDB errou e tem que fazer uma autocrítica. Não adianta pedir desculpas” é o teaser do programa. A ala que apoia Aécio iniciou uma patrulha em torno de Tasso, um dos idealizadores do filme. O programa ainda não foi gravado, mas já tem roteiro pronto. Num ato de tucanismo explícito, o partido não vai dizer onde errou nem fulanizar os problemas, mencionando as acusações contra Aécio, Alckmin e o senador José Serra, todos enrolados na Lava Jato. Vai dizer que a sigla errou ao ter se deixado levar pelas velhas práticas políticas de toma lá dá cá.  Se a câmera se der ao trabalho de dar um zoom no Palácio do Planalto, vai flagrar o ministro da Secretaria de Governo, Antonio Imbassahy, do PSDB da Bahia, como balconista da loja do governo Temer. Tucanos se espreitam tentando encontrar um discurso. João Doria passa longe de tudo isso. Vocifera contra a esquerda e promove uma turnê que ainda conta com paradas na Paraíba e em Rondônia só neste mês. João Doria dança.