sábado, 20 de janeiro de 2018

Governo Trump chega a seu primeiro aniversário paralisado


O presidente americano Donald Trump - Evan Vucci / AP

Henrique Gomes Batista - O Globo



WASHINGTON. O primeiro aniversário do governo de Donald Trump não poderia ter um gosto mais amargo: além de protestos por todo o país neste sábado, o presidente terá de enfrentar um shutdown, a paralisação dos serviços públicos por causa de um impasse orçamentário. Na madrugada deste sábado ele e seu partido não conseguiram os 60 votos entre os cem senadores para aprovar um acordo provisório que evitaria o “apagão” da administração, algo que não ocorria nos Estados Unidos há cinco anos.

Para evitar o shutdown, um acordo precisaria ser aprovado até a meia noite de sexta-feira. 

Mas agora serviços não-essenciais, como parques nacionais e museus, serão afetados, além de impedir novos programas e projetos públicos. Um grupo que representa 38% dos servidores públicos federais, algo como quase um milhão de pessoas, terá que ficar em casa a partir de hoje - em um limbo sobre a situação de seus salários. A falta de acordo sobre a extensão do o DACA - programa que evita que cerca de 700 mil pessoas sem visto que chegaram aos EUA como jovens e crianças sejam deportados, os chamados dreamers que foi suspenso por Trump e cuja prorrogação está na base do impasse orçamentário - e de recursos para o presidente iniciar a construção de seu prometido muro na fronteira com o México impediram um acordo.

“Esta noite, eles (os democratas) colocaram a política acima de nossa segurança nacional, famílias militares, crianças vulneráveis e a capacidade do nosso país de servir todos os americanos. Não negociaremos o status de imigrantes ilegais enquanto os democratas levam nossos cidadãos legais como reféns sobre suas demandas imprudentes. Este é o comportamento dos perdedores obstrucionistas, e não dos legisladores”, informou uma nota oficial da Casa Branca minutos após a definição do shutdown, cerca de uma hora antes do prazo limite.

A Câmara dos Representantes aprovou, na noite de quinta-feira, uma medida que daria fundos provisórios por mais quatro semanas, ampliando o tempo para evitar a paralisação, mas os senadores não queriam votar uma terceira prorrogação - o orçamento americano deveria ter sido aprovado em setembro e começar a valer em primeiro de outubro. Mas não houve acordo no Senado. A proposta só obteve 50 votos, dez além do mínimo necessário.
Imediatamente, a disputa política se aflorou. O líder dos republicanos no Senado, Mitch McConnel, acusou os democratas.

- Talvez no outro lado alguns de nossos colegas democratas estão se sentindo orgulhosos de si mesmos, mas o que esta obstrução conseguiu? A resposta é simples: o fechamento de seu próprio governo - disse. - O que acabamos de testemunhar foi uma decisão cínica dos democratas do Senado que vai atrapalhar milhões de americanos por causa de jogos políticos irresponsáveis.

O senador Chuck Schumer, líder da minoria democrata que se reuniu com Trump na tarde de ontem na busca de um acordo, acusou o presidente:

- Durante a reunião (com Trump), em troca de proteções fortes (aos jovens do Daca) coloquei relutantemente o muro da fronteira na mesa de discussão. Mas mesmo isso não foi o suficiente para atrair o presidente a um acordo - Schumer. - Do fundo do meu coração, pensei que possamos ter um acordo esta noite.

Pesquisas divulgadas durante o dia mostravam que ambos tinham a perder, mas que o prejuízo tende a ser pior para Trump e seus correligionários. Um levantamento do “Washington Post” com a rede de TV ABC apontou que 48% dos americanos creditavam ao presidente e aos republicanos o eventual shutdown, contra 28% que culpavam os democratas - 18% acusavam ambos os lados, 1% nenhum dos lados e 5% não opinou. 

Levantamento da CNN apontava para dado similar: 31% culpavam democratas, 26% os republicanos e 21% a Trump, ou seja, o presidente e seu partido seriam responsáveis para 47% dos eleitores (besta pesquisa, 10% culpavam os dois lados).

Se os números iniciais eram piores para quem controla a Casa Branca e as duas casas do Congresso, outros pontos da pesquisa alarmava democratas. No levantamento da CNN 56% dos eleitores indicavam que o mais importante era evitar a paralisação do governo, contra 34% que indicavam salvar o DACA. Ocorreram shutdowns em 2013, 1995 e 1994, mas sendo, em todos os casos, resolvidos pouco tempo depois. O cenário político, contudo, era menos radicalizado que agora.

Mas havia problemas mesmo entre os republicanos. Enquanto Trump insistia em recursos para seu muro, ficou público que muitos republicanos não priorizam a barreira fronteiriça e preferem mais recursos para a área de defesa, incluindo seu chefe de gabinete, John Kelly, que em uma conversa privada com deputados, vazada à imprensa, teria dito que Trump já não defende o muro como antes, ato que foi contestado pelo presidente em sua conta de Twitter. O episódio escancarou a primeira grande divisão na Casa Branca desde que o ex-general Kelly assumiu o posto com a missão de fazer o governo operar melhor.

As negociações, contudo, continuam. Mick Mulvaney, diretor do Escritório de Administração e Orçamento da Casa Branca, disse na tarde de ontem que um acordo poderia ser obtido durante o fim de semana, quando o shutdown já estaria valendo, mas sem afetar nenhuma dia útil.

- Acredito em um acordo em 24 horas. Penso que teremos algo que as repartições públicas tenham que abrir suas portas na segunda-feira - disse em entrevista à CNN.

Mas, até lá, esta situação tende a intensificar os protestos de hoje contra Trump. Assim como ocorreu em sua posse em 20 de janeiro de 2017, marchas de mulheres por todo o país - e pelo mundo - vão às ruas contra as políticas de Trump, o presidente pior avaliado em um ano de governo na História recente dos EUA.