sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Letterman e Obama é babação cool entre amigos

Marcos Augusto Gonçalves - Folha de São Paulo


Assisti, enfim, à volta de David Letterman no Netflix, com entrevistados tipo que justificam o título da série –“O Próximo Convidado Dispensa Apresentações”.
A primeira estrela, como se sabe, foi Mr. Obama, com aquele jeitão cool de ser “rempli de soi-même”–e notável talento e experiência para showman. Não precisa ser crítico para constatar que foi uma babação entre amigos.
Babação não é um bom procedimento jornalístico, mas são dois ex. E a identificação entre entrevistador e entrevistado pode ter momentos luminosos e nem sempre é constrangedora e rasa. Há muito de interessante na entrevista. Mas o clima da coisa é de convescote do Partido Democrata.
Morei um ano em Nova York durante a presidência de Barack Obama, entre 2013 e 2014. Vi ele falar e fazer coisas que me fizeram pensar: “Em matéria de presidente (presidentes, convenhamos, pelo menos para mim, são basicamente bullshit, mesmo que sejam ótimos) eu nunca tinha convivido com um tão bom”.
Letterman tentou fazer Obama falar mal de Trump, mas não conseguiu. Bush já perdeu esse pudor. Politicamente é boa uma discussão sobre a tradição paradoxal da democracia americana de dificultar o voto. Nem feriado rola.
Além do papo, divertido, civilizado e sempre muito do bem, o programa tem toda uma onda com “civil rights”, especificamente em torno de John Lewis, lenda viva da luta pelos direitos dos negros e dos valores democráticos nos EUA –a quem Trump atacou, numa de suas incontinências nas redes sociais.
Sim, pena que tenha vindo esse cara truculento. Mas afinal, se Obama foi essa coisa toda, por que não conseguiu fazer sua sucessora? Ou outro candidato que pudesse ter representado uma continuidade de seu governo?
Isso, claro, Letterman não perguntou.